terça-feira, 17 de junho de 2014

Entre o físico e o emocional – Transição entre pretéritos, presentes e futuro.



“Cheguei a pensar que você merecia a chance de descobrir que ter amor é muito mais do que ter bebida e mulheres todas as noites, mas você não compreende. Sua cabeça de cima não te deixa compreender o óbvio: Que sua vida de solteiro não vai te preencher tão bem quanto eu te preenchia.”

Oi.
Meu nome é Júlia, e isso é tudo o que você pode saber sobre mim.
Não me leve a mal, isso não é grosseria. Falta de educação, tampouco. É mais um dos escudos que me senti obrigada a criar para tentar salvar os restos do coração, que ainda estão firmes aqui dentro. Precisei encontrar o ponto exato, nessa transição entre passado, presente e futuro, onde minha maturidade se elevaria mais alguns anos em poucos meses. Isso sempre acontece quando alguém muito próximo me decepciona, sendo de forma cruel ou não (e foi), e apesar de ser doloroso, é uma das coisas mais espetaculares que já que me aconteceram na vida.
Gostaria de introduzir melhor este texto, que é um dos milhares de escapes que tenho quando estou muito cheia e quero transbordar. Transbordar mágoas e palavras, molhar o papel inteiro e me sentir aliviada no final do dia, como se a maioria dos meus problemas tivesse escorrido para a folha. Tenho estado tão cheia, aliás! Às vezes, quando não consigo controlar ao menos o orgulho desvairado que insiste em apodrecer meu coração, as palavras simplesmente se recusam a sair. É quando, finalmente, começo a transbordar pelos olhos, e as lágrimas quentes molham meu rosto ao invés das palavras se adequarem ao papel.
Ah, estou tão ansiosa para transbordar tudo o que tenho sentido nos últimos dias. Fisicamente, psicologicamente e emocionalmente. Então, caro amigo que não pode saber nada sobre mim além do meu nome, vou tentar descrever o mais fielmente possível o que aconteceu comigo nas últimas semanas. As primeiras dentre as centenas que virão.
Dois dias após o fim de mais um relacionamento, fiz o que a maioria das pessoas faz para ocupar a mente e passar o tempo: comecei a frequentar a academia. Em menos de uma semana, machuquei minha coluna, e a inflamação se estendeu até o nervo ciático. Sinto dores vinte e quatro horas por dia, algumas mais leves, outras bem agudas. Como se não bastasse, sinto um ligeiro incômodo na região do apêndice. Fui a dois hospitais diferentes, tomei tantos comprimidos para dor e injeções realmente dolorosas que até perdi a conta. Tirei sangue para fazer uma bateria de outros exames e chorei horrores na sala de raio-X, pois o enfermeiro machucou minha perna. O lado direito do meu corpo está inchado devido ás inflamações, e por isso eu não consigo caminhar direito. Ao que tudo indica, tenho o mesmo desvio na coluna que meu avô materno (obrigada, vovô) e uma das minhas primas mais novas, e somar isso á neurite enverga meu corpo para o lado, o que me faz ficar torta. Quando caminho uns poucos metros, meu pé direito arde como se cinquenta pessoas estivessem apagando cigarros nele ao mesmo tempo. Perdi quatro provas na universidade, o que significa que vou pagar duzentos reais de reposições, fora a mensalidade, o transporte e os mais de oitocentos reais gastos com medicamentos, exames e consultas.  Estou preocupada com os meus pais, que não param um segundo e trabalhar e estão investindo tudo para que eu fique boa logo. Fico em casa na maior parte do tempo, e quando saio, é para fazer exames ou tomar soro nas veias.
Mas também me aconteceram coisas boas. Recuperei velhos amigos e perdoei algumas mágoas. Constatei que algumas pessoas não me magoaram de fato, apesar de eu achar que sim, e que outras tiveram a intenção clara de arrebentar meu coração, mas hoje não significam nada além de boas lembranças engraçadas que ainda me arrancam gargalhadas sinceras. Com tudo isso ocupando meu consciente, não resta muito tempo para pensar em coisas desnecessárias. De uma forma ou de outra, a academia acabou cumprindo minhas expectativas: oferecer outras coisas em que pensar e dores diferentes para sentir, pois ainda que os meios tenham sido diferentes, a conclusão de tudo está me oferecendo o resultado aguardado: outro foco.
Poucas pessoas vieram me visitar. Algumas ligam diariamente para saber como estou, outras não me questionam sobre isso nem nas redes sociais. Mas é bom que isso aconteça. Sempre ouvi dizer que os falsos somem quando a dificuldade chega, e finalmente posso concordar: Somem mesmo. Fico sentada no sofá da sala o dia inteiro (o médico recomendou repouso absoluto), esperando a hora de tomar os remédios enquanto o tempo passa lá fora, e meus sonhos vão se adiando um de cada vez. O que vejo pelos vidros da janela é o tempo fechado, escuro, o vento frio balançando preguiçosamente as árvores, a brisa gélida e a garoa mansa que varre as calçadas. Tempo muito nostálgico. Esses dias a dor não me deixou dormir, então acabei presenciando uma das cenas mais incríveis da minha vida: a lua de sangue.
Quando meus amigos me perguntam como estou, não sei exatamente o que responder. Fisicamente, é muito fácil descrever. Emocionalmente, sinto que há algo errado. É como se eu estivesse sob efeito de algum relaxante muscular muito forte: Sei que o que sinto é dor, mas não é em intensidade elevada. Pensei que não me encontraria mais quando as coisas atingissem o fim, mas está tão fácil seguir em frente. Do jeito que estou acostumada a fazer, me isolando do mundo enquanto as feridas vão sendo gradualmente transformadas em cicatrizes. Tive ajuda sobre isso, aliás. À medida que fui me deparando com as coisas ocultas aos meus olhos, fui absorvendo a realidade que muitos queriam que eu enxergasse desde o início.
Realidade que não foi fácil adotar, que fique claro, pois ir ao encontro dela seria contradizer tudo o que acreditei e julguei correto nos últimos anos. Mas o que seria da vida sem a sabedoria que as decepções nos trazem? Então aceitei a realidade de bom grado, e com ela, todas as cores que eu precisava ver para me livrar da mesmice de continuar oferecendo chances a alguém que deixou meu mundo quase inteirinho preto e branco.
Não estou mais cega. Agora vejo realmente a realidade colorida das coisas. Já não há nada oculto. Tive meu coração quebrado e meu amor despedaçado. Fui última opção e passei de presente para passado em apenas dias. Abusaram dos meus carinhos e jogaram fora tudo o que eu tinha, mas quer saber? Prefiro as cores da minha tristeza anestesiada. Prefiro a realidade sufocante das coisas que já não estão ocultas. Apesar de tudo, entre meu corpo e meu coração, prefiro muito mais a dor de milhares de decepções. Eu trocaria essa inflamação no nervo ciático por vinte corações partidos. Estou melhor emocionalmente agora, mas sei que as coisas vão mudar.
Tudo o que preciso é de um pouco de tempo, afinal de contas, meu nervo precisa melhor antes que a anestesia no coração passe.

PS.: Ler ouvindo Coldplay ou A-HÁ.

sábado, 7 de junho de 2014

O porto-seguro de Marina: as marcas e lembranças que não querem ir embora...



Quase meia noite. Os ponteiros do relógio se arrastavam lentamente na escuridão de breu, na casa da fazenda. Quase todas as pessoas estavam dormindo, exceto Marina, que ainda se revirava nos cobertores, procurando uma posição em que perna recém fraturada não incomodasse tanto. Por fim, desistiu de tentar dormir, levantou-se cautelosamente para não acordar a irmã, e procurou os comprimidos para dor e os fones de ouvido. Tomou dois relaxantes musculares de uma vez, sorvendo rapidamente a água da garrafinha de plástico, e se arrastou para fora, mancando. Os roncos na sala de estar indicavam a presença dos outros, embora ela não fosse capaz de identificá-los naquela escuridão. O mais silenciosamente que pôde, girou a chave na fechadura e saiu porta afora, sem medo. Sabia que aquele lugar era seguro, mesmo naquele horário. De qualquer forma, a noite estava tão clara que ela podia distinguir o contorno das montanhas ao longe.
Marina atravessou a varanda em direção ao grande calçadão de pedra onde os tios costumavam fazer churrascos e farras. Acomodando-se em uma das cadeiras acolchoadas que a irmã havia se esquecido de guardar, ela jogou a cabeça para trás e observou o universo nu á sua frente. Sem os arranha-céus e a poluição da cidade grande, era fácil localizar cada estrela pulsante que dançava diante dos seus olhos. A lua erguia-se imponente, dourada como ouro, iluminando as pequenas estradinhas de terra e as silhuetas das árvores mais próximas, que balançavam agourentamente á brisa gélida. Marina conectou os fones de ouvido ao celular e selecionou vinte músicas, agrupando-as em uma play-list. Não eram felizes. Não mesmo. Mas o coração dela não estava mesmo querendo músicas felizes, e sim aquelas que parecem álcool em contato com as feridas abertas: machuca. Marina queria as músicas que provocariam uma dor instantânea.
Apesar do que estava sentindo, ela não queria chorar. Tentou sufocar a dor, organizar o bolo desconexo de sentimentos que se aglomeravam em sua garganta, mas tudo o que conseguiu foi abrir mais uma ferida. Segurar tudo aquilo não era a solução. Não caberia dentro da caixinha de orgulho que ela tinha dentro de si, e certamente, se coubesse, não ficaria guardado lá dentro por muito tempo. Marina sentiu as lágrimas queimarem seus olhos. As estrelas ficaram momentaneamente embaçadas e o vento soprou mais forte em seu rosto. Ela olhou ao redor, certificando-se de que estava mesmo sozinha. A casa continuava na escuridão. Todos dormiam. Marina puxou o ar com dificuldade, olhou para cima uma última vez, depois sucumbiu: chorou como se tivessem acabado de lhe cortar as duas pernas fora.
Sentimentos grandiosos precisam de reciprocidade justamente porque não cabem dentro de um só coração sem que haja uma série de feridas e mutilações em uma pessoa. Sentimentos assim precisam ser divididos, aceitos por outra pessoa, outro coração que os conforte e abrigue. A dor que Marina estava sentindo consistia basicamente nisso: ela guardava amor, sozinha. No início, quando viveu em seu pequeno mundo de sonhos, iludiu-se com a miragem de uma possível reciprocidade. Mas miragens são apenas miragens, coisinhas que o cérebro cria quando não consegue aceitar a realidade e quer de todas as formas, impor uma solução, uma alternativa que seja, um segundo caminho. O fato é que algumas estradas vão te levar ao mesmo lugar, mesmo que você tente ir por outros caminhos, trilhas distintas, segundas opções. E tudo o que Marina fez não conseguiu evitar que ela chegasse ao fim de tudo sozinha. A reciprocidade não existiu.
As lembranças daquela noite estavam absolutamente cruéis. Aquela fazenda era especial principalmente porque era um porto seguro, um lugar tranquilo quando Marina precisava. Quando os problemas ameaçavam fazer seu mundo ruir, ela se refugiava ali e sempre encontrava uma solução, um meio de escapar da tempestade. Mas, como dizem por aí, é um risco apresentar seu porto seguro a outras pessoas. Principalmente quando essas pessoas são tão especiais. É perigoso porque, inevitavelmente, elas vão deixar marcas que vão continuar ali mesmo quando elas forem embora.
Marina fechou os olhos com força e tentou segurar o choro na garganta, mas as imagens que surgiam em sua mente eram perversas demais. Desejou, com todas as forças, esquecer aquele dezembro doce, onde achou ter encontrado a felicidade. Detestava aquelas lembranças, pois elas cortavam fundo seu coração, que já era em si um aglomerado de feridas abertas. Lembrou-se dos sorrisos, da sensação de paz que invadia seu ser enquanto descansava em braços alheios. O céu estava exatamente assim naquela noite. Marina distinguiu suas constelações preferidas e observou-as atentamente, assim como fez naquele dezembro. Doce e feliz dezembro. Se então já soubesse que tudo o que viveu foi uma farsa, talvez a dor fosse mais amena. A grande verdade era que, sozinha naquele lugar, Marina chorou por tudo o que queria que sua vida tivesse sido, e por perceber que seus sonhos eram tolos diante dos planos do destino.
Ela nunca quis que tudo acabasse daquela forma. Nunca desejou que sua história tivesse tomado aquele rumo. Quando choramos por algo que acabou, certamente aquilo foi bom, nos trouxe paz, alegria, ou algo mais forte. Tão forte que nós choramos por saber que não o teremos mais, por melhor que isso seja para o nosso futuro. Marina sempre se deu demais em prol das pessoas que ama. Sempre se desmontou, moldou, reorganizou tudo e qualquer coisa para conseguir se encaixar perfeitamente na vida das pessoas, no mundo. De tanto se desmontar, se quebrou. Marina estava quebrada e sabia disso melhor que todos os outros. Seu coração e seu cérebro estavam trabalhando de forma diferente agora, pois não se conectavam mais. Razão e emoção pareciam ter, definitivamente, se separado dentro dela.
 Mesmo sabendo que toda a dor era fruto da mentira que havia vivido por seis longos (e ao mesmo tempo, tão curtos) meses, ela não podia negar que estava começando a sentir uma falta desesperada daqueles tempos. Mas não se pode viver de sonhos, Marina! Eu sei, ela me responde, ranzinza. Todo mundo sabe. A realidade, embora mais cruel, é também mais atrativa e muito mais convidativa. Ela nos apresenta o mundo como o é, sem máscaras ou mentiras fantasiadas de verdades. Viver dentro dos sonhos é bonito. Quente e aconchegante. Mas só a realidade é capaz de nos conceder o chão que nós precisamos para seguir em frente. Os sonhos, embora nós gostemos de vivê-los, são uma eterna desculpa para não viver tudo o que a realidade nos oferta, e que, em geral, são coisas boas.
Perto das duas horas da madrugada, Marina decidiu voltar para o quarto. Agora os relaxantes musculares estavam fazendo o efeito esperado. Ligeiramente grogue, a dor completamente aliviada, ela sorriu antes de voltar para dentro. Ao pé da varanda, uma última olhada para o céu. Embora aquele dezembro tenha ficado no passado, o brilho daquelas estrelas presenciou tudo o que aconteceu naquela noite. Boas lembranças, retiradas de mais um sonho que acabou. Uma nuvem de mentirinha que se desfez. A nostalgia crescia em ondas dentro dela, mas as lágrimas já não escorriam. Embora pisoteada, com o coração completamente partido e ainda sangrando, ela sabia que as coisas melhorariam. As razões do destino são obscuras, mas talvez em um futuro não muito distante, ela compreendesse todas aquelas mudanças repentinas e dolorosas.
Marina é apenas mais uma adolescente de dezenove anos que teve o coração partido por um idiota. Ela vai saber o que fazer com isso. É só mais uma entre as centenas de decepções que ela teve e terá na vida.

Play-list da Marina (as 20 músicas tristes):

• Sparks – Coldplay.
Everything – Lifehouse.
• Make you feel my love – Adele.
• Careful where you stand – Coldplay.
• Love of my life – Queen.
• If you say so – Lea Michele’s voice.
• Face the sun – James Blunt.
• Vento no litoral – Legião Urbana.
• The reason – Hoobastank.
• Clair de Lune – Debussy.
• Fly away from here – Aerosmith.
• Codinome beija-flor – Cazuza’s voice.
• How could and angel break my heart? – Toni Braxton.
• In loving memory – AlterBridge.
• Lama – Luxúria.
• Mais que a mim – Ana Carolina ft. Maria Gadú.
• Mil pedaços – Legião Urbana.
• You lost me – Christina Aguilera.
• Your love means everything – Coldplay.
• Proof – Coldplay.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Sobre transbordar as dores e recusar as submissões


- Informações básicas:

• Como está o dia em que escrevo este texto: Chovendo. Frio. Nuvens escuras se espalham pelo céu cinzento. A brisa gelada balança preguiçosamente as folhas das árvores. Tudo parece calmo demais, triste, nostálgico. Um típico dia onde tudo nos faz lembrar coisas boas (e falsas) que já não voltam mais.

• Músicas que ouvi enquanto escrevia: Sparks (Coldplay), Make you feel my love (Adele), If you say so (Lea Michele), Face the sun (James Blunt), The scientist (Coldplay), Everything (Lifehouse), Conversa de botas batidas (Los Hermanos), Morada (Sandy Leah), How Could An Angel Break My Heart (Toni Braxton), For you (Coldplay), Proof (Coldplay), Jar of hearts (Lea Michele’s voice), Só vejo você (Tânia Mara).

A realidade está cada vez mais pesada nos meus ombros. Esperei do tempo ao menos um alívio, um indício de que as coisas logo melhorariam, que as feridas desapareceriam e deixariam apenas cicatrizes esbranquiçadas sobre o meu coração, mas o efeito está sendo totalmente o contrário. Sinto como se estivesse saindo de um coma profundo e as lembranças começassem finalmente a se arrastar de volta para o meu consciente. Todas as coisas acabadas que eu julguei inacabáveis, retornando lentamente, arrancando a casquinha das feridas e fazendo com que o sangue volte a escorrer livremente, ardido e dolorido, pelas brechas de um coração infectado de nostalgia.
Hoje seriam nove meses. Estaríamos juntos, certamente, independente dos nossos horários de aula. Fiquei o tempo inteiro tentando afogar as palavras que vivem tentando escapar de mim, porque não quero mais te escrever coisas lindas que você nunca vai ler, nem te desejar o bem apesar de tudo o que você me fez, tampouco ter uma desculpa sequer para permitir que você ocupe minha mente. Mas não escrever sobre você, no dia de hoje, seria uma falta de respeito, e vou explicar isso melhor: Sei que você foi falso do início ao fim, acredite quando digo que sei e tenho certeza absoluta disso. Mas tudo o que eu tinha era verdadeiro, e não escrever sobre isso seria me inundar cada vez mais da sua falsidade, coisa que eu não quero mais fazer.
Veja bem, meu amor, dores precisam ser sentidas. Fugir de uma dor é como mentir para si mesmo. Pode adiantar por um mês ou dois, talvez até mais, mas sempre vai ter um dia, uma música, uma conversa, um olhar, um cheiro, que vai trazer tudo á tona. O pior dentro de tudo isso é que dores escondidas acabam por se fortalecer através de suas próprias lembranças boas. Um dia, quando as lembranças boas simplesmente não bastarem mais, a dor se revela e acaba se alastrando por mais espaços, ferindo mais profundamente, preenchendo por mais tempo. Uma dor adormecida, quando finalmente desperta, acaba destruindo todas as resistências que alguém criou durante o período de “dormência”. E isso, meu amor, é vinte vezes pior do que sofrer tudo o que há para sofrer de forma imediata.
Desde o início do fim, tenho procurado formas não letais de descarregar minha dor. De todas elas, escrever sempre foi minha melhor saída, e primeira opção absoluta. Há dias em que estou travada, concentração baixa, cabeça em outro mundo, mas também há os dias em que as palavras se agrupam perfeitamente em minha mente, o que torna mais fácil conduzir meus dedos pelo teclado do computador. É bem melhor quando os desabafos já estão ali ao invés de esperar que se façam, de forçar qualquer coisa para fora simplesmente porque não suporto mais confortá-la dentro de mim. Não estou mais tão egoísta. Virei morada de sentimentos que pensei nunca mais confrontar, mas que agora são minha principal companhia através dos dias.
Às vezes, consigo chorar. É raro. Na maioria do tempo, as lágrimas ficam apenas acumuladas e se recusam terminantemente a escapar. Não me leve a mal, meu amor, sei muito bem que você não merece minhas lágrimas, nem minhas palavras bonitinhas, nem a organização (ou a falta de organização) dos meus textos, mas não faço isso só por você. Faço isso para não morrer afogada dentro das minhas próprias lágrimas, repletas das lembranças falsas que eu julguei verdadeiras um dia. Esconder que sente, ainda é sentir. Tentar fugir do que sente, ainda é sentir. Chorar no escuro, quando todos os outros estão dormindo, ainda é chorar, e melhor que isso, aliviar o peso de tudo o que podia ter sido, e não foi. O nós que não aconteceu dentro de você, e os nós que se desfizeram, arrebentando mais forte do meu lado, mais fraco, ferindo mais rápido e com maior intensidade.
Busco não me concentrar nas informações que as pessoas fazem questão de me trazer sobre sua vida, e como as coisas estão dando certo para você. Não queria mencionar que isso corrói um pouco meu coração a cada dia, porque vivo nessa incessante espera de que você sinta minha falta, se arrependa, volte atrás para eu poder te dar um não choroso e mentiroso, mas que a verdade seja dita: Ao que tudo indica, você está melhor sem mim. Soube disso no momento em que sai da sua casa pela última vez e você não veio atrás, nem uma ligação ou mensagem, nem um apelo sequer. Porque ambos sabíamos que você tem a maioria da porcentagem de culpa por esse fim, mas parece que eu sou a única que aceita essa verdade. Você, o grande traidor e mentiroso dessa história, insiste em negar o que fez.
Todos os dias, sinto falta do que nós vivemos. Enquanto suas praticas “extraconjugais” ainda estavam ocultas, era seguro pensar em estar nos seus braços. Uma sensação abrasadora, diferente de muitas coisas que eu já senti na vida, mas bom, sob todos os aspectos. O tempo acelerava, assim como o meu coração e o meu desejo de estar colada em você, como se não fôssemos enjoar da cara do outro jamais, como se as briguinhas desgastantes por motivos fúteis nunca fossem acontecer. Mas aconteceram. Estávamos sempre tão conectados, tão ligados, tão juntos, que os defeitos começaram a saltar aos nossos olhos antes que nos déssemos conta, o que seria um problema mesmo se o que sentíamos um pelo outro fosse verdadeiro de ambos os lados.
Sentimentos verdadeiros às vezes não suportam os defeitos alheios. Como tolerar infidelidade? Mentiras? Omissões constantes? Ausência exacerbada? Ignorância? Bipolaridade? Nenhum sentimento verdadeiro se sustenta em bases assim. Sei que há os que defendem que o amor verdadeiro tudo suporta e tudo perdoa, mas meu caro amigo, as coisas não são bem assim! Amar de verdade também é saber a hora de abrir mão da presença do outro em prol do seu próprio bem estar. A regra do “ruim com ele, pior sem ele” não pode mais existir para situações como essa. Está ruim com ele? É preciso coragem para tirá-lo da nossa vida e fazer com que tudo melhore, porque antes de amar verdadeiramente o outro, devemos amar verdadeiramente a nós mesmos.
E me amar verdadeiramente foi o principal motivo para que eu fosse até o meu quarto, trocasse de roupa, pegasse meu celular e algum dinheiro, e fosse direto para a sua casa encerrar nossa história. Chorei durante o caminho, mas nada que deixasse meu rosto tão inchado que você fosse perceber alguma coisa. Fui ensaiando na minha cabeça a conversa perfeita, o tom de voz que deveria usar e as frases marcantes que jamais sairiam da sua mente. Fui me preparando psicologicamente para destruir nosso mundo, que eu havia passado tanto tempo para construir. Sem dúvida, foi uma das decisões mais difíceis que precisei tomar para seguir inteira, ainda que me faltasse você como pedaço. Continuar ao seu lado seria perder constantemente minha identidade, aceitar as migalhas que você estivesse disposto a me oferecer, sabendo que sou capaz e que mereço alguém melhor do que você. Continuar ao seu lado seria um luto constante por cada parte de mim que ficaria pelo caminho, minha autenticidade jogada fora, minha personalidade desmontada e desfeita para sempre. Por isso, entre você e eu, eu prefiro seguir sozinha, porém munida de todas as armas e atributos e defesas que só eu compreendo, e que são minhas por direito.
Morro de medo de ser uma dessas mulheres que aceita qualquer coisa do marido/noivo/namorado. Desculpe meu amor, mas submissão não é prova de amor. Igualdade sim, e digo mais: Respeito recíproco. Os dois agindo em prol da continuação do relacionamento, e ambos se esforçando ao máximo para isso, porque não adianta se esforçar apenas na hora de conquistar e largar de banda depois disso. Amor também desgasta. Amor também começa a passar lentamente. E quando precisamos abrir mão de nós mesmos para viver algo, sinto muito, mas não é amor. Amor exige certas lapidações, mas a partir do momento em que é preciso destruir o outro para reconstruí-lo da nossa forma, vira posse, paixão, loucura. E embora todo amor tenha, no fundo, algumas pitadas de loucura, a loucura em si não é capaz de sustentar o amor de verdade. Sobriedade e lucidez, sim.
Foi desesperador o caminho até te deixar porque eu comecei lentamente a perceber que não tinha opção. Quando suas mudanças começaram a se tornar evidentes, pensei comigo mesma que não poderia seguir ao seu lado simplesmente por ainda não saber como seria viver sem você. Eu me recuso terminantemente a viver algo que me faz mal. Eu me recuso terminantemente a ser só mais uma dessas mulheres que aceita tudo calada, igual uma cadelinha sem dono. Eu me recuso, terminantemente, a ser submissa. Eu me recuso, entendeu? Por isso, com toda a dor do mundo, eu te deixei. Pela segunda vez. Eu te deixei, mesmo que ainda não tenha conseguido te arrancar completamente do meu coração.  Mas eu prefiro isso, sabia? Prefiro sofrer sozinha a empurrar com a barriga algo que eu sei que não vai pra frente nem se a gente der um chute com toda força.
Provavelmente ainda estaríamos juntos se eu não tivesse acabado tudo. E estaríamos completando nove meses hoje. Mas isso não seria motivo de comemoração, e sim de tristeza. Veja bem, meu amor, você não teria mudado em nada para melhorar nosso relacionamento, apenas teria continuado regredindo de acordo com a opinião e as vontades dos seus melhores amigos, e com a porcentagem da sua própria vontade em se sentir liberto de qualquer compromisso sério, ainda que não tivesse coragem de me dispensar. Então, eu, com minha insistente mania de sempre tornar as coisas mais fáceis pra você, dei um fim ao seu sofrimento, e iniciei um novo ciclo do meu. No final das contas, continuei pensando no seu bem estar. O que mudou foi que precisei me afastar completamente da sua vida pra isso.
Apesar de todos os pesares, de todas as dores da sua ausência sentida e dolorosa, continuo defendendo a ideia de que foi melhor dar fim a isso. Sei que você concorda cem por cento comigo, ainda que seja doloroso para mim. Digo e fico repetindo toda hora que foi melhor, porque mesmo tendo certeza que sim, às vezes, quando a saudade aperta um pouquinho e o coração sangra, um por cento da minha composição pensa se não teria sido melhor ir por outro caminho. A sorte é que, no mesmo segundo, os outros noventa e nove por cento surgem e abafam os protestos da pequena criaturinha chamada saudade. Pronto, problema momentaneamente resolvido!
Estou há dias como um balão muito cheio, mas o que me preenche são as palavras, que precisam escapar de alguma forma. Como não consegui ordená-las de forma coerente, pelo menos as organizei em frases e parágrafos. Não importam os meios, em todo o caso. Meu objetivo é esvaziar essa dor lancinante que tem se intensificado nos últimos dias, com a aproximação do inverno. Sou completamente apaixonada por dias escuros e nostálgicos, mas a verdade é que eles atiçam as dores mais profundas que uma pessoa é capaz de sentir. E isso é a última coisa que preciso: atiçar as dores. HÁ HÁ. Como se já não estivesse doendo o suficiente.
Mas, apesar de tudo, há algo que não consigo descarregar. Já escrevi mais de duas mil palavras neste texto, e ainda não consegui encontrar um meio de coloca-la para fora. Frustração. Por tudo. Por ter sido tudo o que você mais precisava, nos momentos que mais precisava. Por ter te ajudado de todas as formas, mesmo que você não merecesse. Por ter conseguido perdoar coisas que antes nem passavam pela minha cabeça perdoar. Por ter secado tuas lágrimas quando os outros te decepcionavam. Por ter me lapidado em todos os lados só para caber na moldura da tua vida. Por ter sido um lugar seguro para você se esconder enquanto atravessava suas tempestades. Por ter sido. Por mim. Por tudo o que eu fiz e você nunca valorizou. Frustração pura, seca, de quem sabe que fez demais por alguém que merecia "demenos", ou não merecia nada.
Ufa, que alívio! Meus ombros estão mais soltos. Os pesos diminuíram nas minhas costas. Respiro fundo, um, dois, três... Conto até dez. Que alívio! Não quero te desejar o mal por causa dessa minha frustração, então provavelmente continuarei falando sobre isso. Sempre. Sobre o quanto você não merecia tudo o que eu fiz e fui por você. Burro. Espero que você... Não, espera, não vou te desejar o mal. Tudo de bom pra você. Ufa, que alívio! Digo e repito: descarregar as dores ajuda. Alívio para a alma, para o coração e para a mente. Acho que, pelo menos por hoje, transbordei o suficiente para continuar seguindo sem você ao meu lado. Foi e é melhor assim.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Bom, vejamos...



 
*selecionando algumas músicas de Coldplay
para ouvir enquanto escrevo*

... Tenho me tornado uma bagunça total nos últimos tempos. Um festival de respostas prontas, sorrisos forçados, e um verdadeiro show de desconfianças e ceticismo. Eu não me incomodaria em ser assim se fosse sozinha, mas desde que deixei algumas pessoas entrarem na minha vida, tive que me moldar para arranjar espaço e encaixá-las de forma correta.
O problema dentro disso é que a partir do momento em que encaixo alguém em um cantinho empoeirado do meu coração, não posso permitir que ela se desenvolva além dos centímetros que lhe cabem. É mais ou menos como plantar uma árvore: de início, quando as raízes se fincam e começam a crescer, precisam de espaço. Se não houver espaço, as raízes vão começar a forçar passagem através de outros caminhos, e acabam destruindo outros ambientes.
Não tinha espaço pra você, quando eu te deixei entrar. Tive que desocupar lugares, limpá-los, esvaziar as mágoas e as poeiras, mandar embora os fantasmas. Coloquei você aqui dentro e tentei cuidar bem de nós dois, mas seu crescimento fugiu ao meu controle. Você, além de fincar suas raízes no seu espaço, quis crescer para outros lados, ocupando mais lugares do que eu normalmente suportaria. Você ocupou terras mortas, fazendo-as se encherem de vida. Isso é assustador, para falar a verdade, porque eu sempre soube lidar com decepções e indiferença, mas não sei me comportar diante de algo como nós.
Você cresceu demais, amigo!
Apesar de todas as vezes que eu quis que tudo avançasse devagar, com calma, como se nós precisássemos desarmar uma bomba. Só que a bomba explodiu. Destroçou-nos, e cada pedacinho seu que se espalhou por mim criou raízes próprias. Não dá mais para mandar você embora, e mesmo que desse, ainda restaria um vazio que sempre me faria lembrar você.
Isso não é bom. Nem de longe. Sempre gostei de manter relacionamentos sérios com meu orgulho e minha independência sentimental, e, além disso, fui e ainda sou ciente de que tenho defeitos que pesam nas minhas costas quando encaro uma relação a dois. Não sou unilateral, sei bem onde estão meus erros e o quanto podem prejudicar o desenvolvimento das pessoas que amo aqui dentro. Mas não consigo refreá-los e atirá-los para longe, então tenho que aprender a conviver com a existência deles. E com toda a dor que me causam.
As raízes que você fincou não são compatíveis com os meus erros. Estão te apodrecendo aqui dentro, maculando sua imagem, fazendo com que eu te veja indiferente e distante, e te vendo assim, não consigo encontrar forças para cuidar de você.
E não encontrando forças, te magoo.
E te magoando, te faço querer ir embora.
E se você for embora, eu te perco.
E se eu te perder, meu amigo, eu não me encontro nunca mais!